Você vai e volta.

Há algum tempo venho trabalhando na análise a necessidade de elaboração e reelaboração das coisas; aquela sensação de passar várias vezes por um mesmo lugar, cada vez de um ponto de vista um pouquinho diferente. 

Depois que terminei, isso ficou muito claro porque muitos temas e questões voltavam com certa insistência e cada vez que eu olhava pra eles percebia alguma coisa diferente, encontrava uma resposta - ou pergunta - mais complexa, me questionava e compreendia um pouco mais. Isso se deu durante vários meses me mostrando como o processo de uma separação, de um luto é longo e tortuoso. Como realmente exige muita reelaboração. 

Normalmente, essas reflexões, essas rebordoses do término vinham na época na menstruação, quando não só estou mais sensível, mas também mais reflexiva e atenta ao meu interior. 

Vinha pensando em amarrar essas reflexões, quando em fevereiro desse ano, ouvi uma palestra com alguns artistas participantes da exposição "Transbordar: Transgressões do Bordado na Arte", do SESC-Pinheiros, e um dos artistas, o Ricky Rodrigues, contou como aprendeu a costurar com seu avô que dizia que "Na costura, você vai e volta". No segundo que eu ouvi essa frase entendi que ela amarrava essas e muitas outras reflexões que vinha tendo. 

Decidi fazer um vídeo simples, bordando em ponto atrás um círculo que mudasse de cor, passando do vermelho vivo pro marrom, chegando no bege/branco, fazendo referência ao ciclo menstrual e a todos ou outros ciclos que existem pela vida.

A gravação foi tranquila, quase como gravar uma performance, mas queria destacar aqui o texto: queria que o texto tivesse uma linguagem bem oral, como se eu conversasse com alguém enquanto bordava, como se ensinasse o ponto de forma despretensiosa, como as avós fazem muitas vezes. Vinha (e venho) pesquisando muito sobre mitologias, sobre tradições orais, sobre conhecimento oral e foi uma grata surpresa quando, numa sentada só, escrevi todo o texto do vídeo. Por mais simples que ele possa ser, ele carrega a síntese - a reelaboração - de tudo que vinha estudando. Às vezes tenho a impressão que leio, estudo, ouço e as coisas não fixam, mas elas fixam sim, são absorvidas e reelaboradas dentro da gente até encontrarem um lugar e momento em que faça sentido se manifestarem. 

Esse é o vídeo mais simples que eu já fiz, mas também o que contém mais pesquisa, mais reflexão. Talvez até o mais íntimo. Enquanto editava - decidi editar porque não queria que o tédio do espectador fosse o elemento mais marcante do vídeo - percebi quão íntimo esse vídeo é e percebi que fazia ele pra mim mesma. Apesar de gostar muito de autobiografia, acredito que as coisas tem que comunicar com os outros e que essa coisa de artistas que fazem as coisas só pra si mesmos é uma cilada enorme, mas talvez às vezes também seja necessário. 

Enfim, esse vídeo marca meu fascínio pela pesquisa e pelo conhecimento. Pela mitologia, pela natureza e pela menstruação. Minha percepção e respeito pelos ciclos. Meus esforços para ter mais calma. 

Entendi muita coisa concluindo esse vídeo.

Como sempre, com carinho e sinceridade,

Lorenza

Link do vídeo: https://vimeo.com/user120594341

Comentários

  1. Um conforto enorme de te ver bordar, e pensar, e filmar, e falar, e bordar, e filmar, e falar, e pensar

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    1. Paola, só vi agora! Ainda não entendi como ver quando tem comentário novo. Que alegria ouvir isso. Você, como sempre, me inspira a continuar. Que bom que te tocou assim <3

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