foto-performance "Descolar-se"

Há bastante tempo venho refletindo sobre se tornar adulto e como isso envolve entender, estabelecer e até defender o que é bom para nós. 

Com frequência me vejo tomando decisões diferentes das que minha família me criou para tomar; estabelecendo outros valores, outros costumes, outras formas de me relacionar e de viver. Meus objetivos, minhas prioridades são diferentes das que imaginaram para mim.

Imagino que isso não deve ser fácil cuidar de uma pessoa que por muito tempo depende de você para tudo, mas que ainda assim não é sua. "Criar para o mundo". 

Conforme cresço, adquiro a autonomia de entender o que me foi ensinado e de escolher o que quero manter e o que não cabe para mim. Penso como esse processo pode ser dolorido, violento até. Com a gente mas também com os outros, com aqueles que se dedicaram para passar para nós aquilo que consideram importante. Fazer entender que o que funciona para o Outro pode não funcionar para nós, ao mesmo tempo que o que funciona pra gente pode não funcionar para o Outro. Saber acolher, valorizar mesmo aquilo que decidimos não usar. Partimos dali, querendo ou não. Tenho dentro de mim até o que não carrego mais, me moldei a partir do molde que fizeram de mim, do molde que fizeram para mim. 

Às vezes, muitas vezes, é preciso força. Força para se desvencilhar, para deixar desvencilhar-se. 

"Descolar-se" é sobre isso. Sobre mudança, sobre crescer, sobre cortar o cordão ou os cordões que me prendem, sobre abrir espaço para o novo. 

Fiquei pensando sobre uma performance, um vídeo, um algo que marcasse esse momento, que marcasse essa descoberta. Pensei em alguma coisa que passasse uma faca pelo contorno do meu corpo, como que cortando essa camada de mim que vem de outros, me desvencilhando e me libertando. Ainda quero fazer algo assim, mas por hora conclui que uma foto-performance seria melhor. Tive essa ideia da cola branca lembrando de quando era criança e sujávamos as mãos de cola, para depois esfregá-las uma na outra e sentir a cola sair. Era um prazer engraçado aquele. 

A cola seca cria uma "segunda-pele" fácil de arrancar - e também me suscita reflexões sobre "colar-me", ou nesse caso "descolar-me". 

Depois de muito matutar, um dia antes do meu aniversário fiz a foto-performance, que foi registrada pelo meu Companheiro - letra maiúscula por essa palavra define muito mais que a nossa relação amorosa. Não teria conseguido registrar sozinha. Foram muitas fotos e o timer não daria conta. Teria que ter parado muitas vezes, o que quebraria minha concentração e até mesmo o caráter "ritualístico" da performance. 









Eis o que escrevi no meu caderno no meu aniversário:

"Gostei muito do resultado. Marca bem esse momento. E foi fácil de tirar a cola, a "pele antiga". Dolorido mas saiu de uma vez só. Acho que é porque terminei de crescer o que tinha para crescer naquela pele: tirei-a na hora certa. Continuo crescendo mas agora nessa nova, que já vinha criando, que vinha descobrindo e na qual terei tempo de me aprofundar, me encaixar para então transbordar para novas peles. A arte é sempre um rito de passagem. As obras sempre me levam para novos lugares. Vou agora replantar minhas plantas, que também transbordam de seus vasos, regadas pelo meu sangue, minha Lua, como se diz."

A parte mais demorada foi esperar a cola secar. Tivemos que ajudar com o secador e ainda assim fizemos as fotos com pontos ainda úmidos, o que me faz pensar que nunca estamos 100% preparados para crescer, para mudar. A inércia é convidativa, mas crescer é necessário. E é bom. 

Estou feliz com o resultado e com as reflexões e aprendizados que tenho tido. Têm sido reflexões muito adultas, rs.

Foto-performance completa aqui.


Como sempre,

 com carinho e sinceridade,

Lorenza











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