A Garrafa de Leite Azul

Quando minha avó adoeceu, tivemos que nos desfazer da casa dela e, nesse processo, descobrimos muitas coisas, entre objetos, cartas, documentos e até alguns cruzeiros. Muitos objetos foram guardados por um olhar atento - e até mais distante das questões emocionais - da minha madrasta. Alguns desses foram os tecidos que cito nesse post e vídeo, outros foram garrafas de vidro retornáveis, nas quais eram entregues leite antigamente. 

Quando me mudei para meu apartamento em São Paulo, herdei muitos objetos, entre eles duas garrafas de vidro: uma azul e uma laranjada. Por alguma razão, a azul sempre foi minha favorita. 

Acho importante ressaltar que muitos desses objetos herdados são muito antigos e sempre levei muito a sério o cuidado com eles, até por ter estudado patrimônio e conservação. O trabalho de conservação é, por sinal, muito interessante: uma constante luta contra o tempo, contra processos que são naturais e esperados.

Pois bem, em junho do ano passado, terminei um relacionamento longo e, alguns dias depois do término e enquanto ainda processava muita coisa, por um descuido, quebrei a garrafa azul. Aquilo que eu cuidava com tanto carinho e esmero para que se preservasse, quebrara. Eu fiquei muito mais abalada do considero que deveria: é que a partir daquele momento a garrafa não era mais só a garrafa de leite da minha avó. 

"Hoje quebrei sem querer essa garrafa de leite que tinha, facilmente, mais de 40 anos. Usava ela pra beber água. Uma das muitas coisas herdadas que constituíram minha casa quando vim morar sozinha. Essa garrafa já me foi alvo de muitas reflexões. Hoje, pensei como algumas coisas não tem como durar para sempre."



Alguns meses depois. conheci uma pessoa que me lembrou de quanta gente ainda há pra amar, do quanto ainda há pra descobrir, do quanto ainda há para viver. 

Logo em seguida, fui à casa do meu pai e encontrei não uma mas três garrafas iguais a que eu quebrei. Iguais não, nunca nenhuma será igual aquela. Mesmo assim escolhi uma, com seus detalhes e defeitos. E essa "nova" garrafa também não era só outra garrafa de leite da minha avó. 


Deixei as outras duas garrafas para minha irmã, pra se um dia ela precisar quebrar uma delas e lembrar de deixar as coisas irem embora quando precisam. 

Essa nova pessoa hoje é um novo amor que me mostra - ou melhor, que descobrimos juntos - que amar pode ser ao mesmo tempo intenso e leve, que deve ser livre. Espero não precisar quebrar mais nenhuma garrafa, mesmo quando eu precisar deixar as coisas partirem, mas, se eu quebrar, tudo bem também. 

Decidi bordar a estampa das garrafas justamente pra ter ela e essas reflexões sempre comigo e, o mais legal, é que meu bordado também tem seus detalhes e defeitos: veio a partir de uma das garrafas mas foi feito por mim. Com meus detalhes e defeitos.

 




Como sempre, com muito carinho e sinceridade, 
Lorenza.





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