nem todo experimento precisa ser compartilhado

Sinto que quando estamos começando a produzir há uma pressão para que tudo vire uma obra, tudo fique bom, tudo seja compartilhado e elogiado. Não é bem assim que as coisas acontecem, nem que devem acontecer e como sinto que isso não é falado o suficiente - como tantos outros temas que fazem parte do processo criativo - quis fazer esse post para compartilhar algumas ideias e processos que "não deram certo" (aspas porque considero todos os processos válidos e enriquecedores).

A primeira é uma tela que fiz para minha mãe, em julho do ano passado, nos dias que entre o PCR que ela fez e o resultado positivo para covid. Ela estava em Curitiba e eu em São Paulo, ambas recém saídas de relacionamentos e no que achávamos que era o pico da pandemia. Peguei algumas flores secas que ela havia me dado no meu aniversário e ouvindo músicas que me lembravam dela, fui fazendo uma espécie de colagem enquanto pedia ao Universo que ela ficasse bem. Embrulhei a tela com a "colagem" em plástico-bolha, exatamente como gostaria de poder fazer com ela. 



Quando finalizei, tive o impulso de fotografar e postar no instagram, visto que tinha acabado de descobrir a possibilidade de fazer e compartilhar telas (vide "A imagem dessas reflexões"), mas me senti invadida. Como compartilhar com os outros algo que fiz pra minha mãe num momento de tanta angústia antes de ela sequer ver a tela? Fiz pra mim e pra ela, num quase ritual que não deveria ser compartilhado. 


Dei a tela de presente pra minha mãe quando cheguei em Curitiba, quando pudemos nos abraçar depois de sua alta. Ela está guardada na casa da minha mãe, toda curvada e amarelada, porque é claro que eu não sabia como tratar as flores para conservá-las e provavelmente os químicos da cola branca e das tintas que usei aceleraram sua decomposição. 

A conservação é um ponto que sinto que poucas vezes levamos em consideração como jovens artistas - às vezes até como artistas mais experientes, com exceção talvez dos fotógrafos. Apesar de ter estudado conservação de materiais na faculdade e em alguns cursos livres, percebo que muitas vezes ignoro que o modo como faço as peças e os materiais que uso influenciam e muito preservação delas. Essa tela é um exemplo bem evidente disso. Acho interessante essa contradição: queremos produzir e ter nosso trabalho reconhecido, mas deixamos nas mãos de outras pessoas a responsabilidade de mantê-las preservadas.

Essa tela ensinou a pensar na minha responsabilidade com a conservação do meu trabalho e me ensinou que nem tudo precisa ser compartilhado, exposto. A intimidade é realmente algo sagrado e o aprendizado mais importante está mesmo no processo.

Obs.: Achei melhor compartilhar o outro exemplo de processo que "não deu certo" no próximo post. 

Com carinho, Lorenza.







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